Com todo o movimento acarretado pelo Covid-19, o Agronegócio não ficaria de fora. Diante da relevância desse setor, representando 21,4% do PIB brasileiro em 2019, segundo o IBGE, é ainda mais importante que as empresas desse setor se posicionem estrategicamente com ajustes em suas operações para um novo comportamento do mercado e as novas formas e relações de trabalho.
Tendo em vista que com a crise ouve, em muitos casos, a redução da renda da população, afetando diretamente a demanda. Em meio a mudança, as adaptações necessárias para o enfrentamento dos impactos econômicos do novo coronavírus geram novos custos, que podem ser solucionados com a emissão de títulos de dívida. Ainda nesse ponto, a valorização do dólar frente ao real favorece as exportações, impulsionando as receitas desse setor, facilitando a absorção desses títulos pelo mercado.
Cadeias e segmentos do agronegócio
Para entender melhor desse setor é necessário entender primeiramente suas cadeias e segmentos que atuam conjuntamente, porém de maneiras distintas.
- Insumos Agrícolas ou “Antes da porteira”: Biotecnologia, sementes, agroquímicos, fertilizantes, nutrição animal, saúde animal, máquinas e implementos agrícolas.
- Agricultura e pecuária ou “dentro da porteira”: Agricultura (Café, Grãos e fibras, Cana de açúcar e outras culturas) e Pecuária (Bovino, Suínos, Frango e outras produções).
- Indústria ou “Depois da porteira”: Proteína animal, tabaco, vinícolas, biocombustíveis, companhias de trading e cooperativas.
Oferta e Demanda
Em relação aos impactos na oferta, com a quarentena foi possível perceber disrupções nas cadeiras de suprimento. Com o setor logístico interagindo diretamente para o abastecimento e transporte dos produtos agrícolas, tendo em vista a maior parte da nossa distribuição é feita por terra, os caminhoneiros passaram a enfrentar diversas dificuldades no transporte de insumos. Na produção agrícola, um exemplo tem sido a diminuição da demanda dos restaurantes.
A crise na demanda tem sido o ponto mais evidente. Nesse contexto, a crise em si gerou uma recessão econômica, afetando a renda das famílias, gerando impactos expressivos em setores como o do varejo. O isolamento social gerou um estímulo a demanda de alimentos não perecíveis como milho, trigo e café. Essa troca nos hábitos de consumo, impactou as cadeias de produtos perecíveis, como frutas e hortaliças. A mudança também se decorreu na substituição de produtos de maior valor agregado por produtos mais baratos.
Contudo, a diminuição da circulação de veículos nas ruas, impactou fortemente a demanda por etanol. Combinado a queda de preços do petróleo fez com que no final de fevereiro e na Páscoa, o preço do etanol Hidratado caísse mais de 34% de acordo com os dados levantados pelo CEPEA (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada). Com a paralização de diversas fábricas do setor têxtil, e atrelada a diminuição dos preços do petróleo, tornaram as fibras sintéticas mais competitivas, acarretando a diminuição da demanda do algodão.
Entretanto pode-se constatar um aumento na demanda por laranja nos EUA, maior consumidor do produto, ocorrendo um aumento de 10% no consumo durante último mês. O aumento do preço da laranja nesse período, pode ser explicado pela fruta ser uma fonte de vitamina C.
Custos e Receitas
O diesel ficou mais barato, em virtude da queda do preço do petróleo, logo, reduzindo custos de produção, transporte interno da colheita e frete para o escoamento da safra. Já os custos dos insumos como fertilizantes e agroquímicos, grande parte importados, tiveram seus custos aumentados em decorrência da desvalorização do real frente ao dólar. Seguindo o mesmo viés, o aumento do custo do trigo, também importado.
Destarte, o aumento do dólar compensa parte da queda dos preços das commodities agrícolas, favorecendo as exportações, exceto quando há preços fixados com operações derivativas.
Incertezas, volatilidades e mercado de câmbio.
Uma vez que o alimento é fundamental a vida humana, a agricultura costuma ser um setor menos afetado em momentos de crise. Ainda assim, a pandemia de Covid-19 trouxe muita incerteza e volatilidade para o mercado das commodities agrícolas.
Embora, os setores de agro não envolvidos diretamente com a alimentação foram os mais impactados negativamente pelo isolamento social imposto no momento. O maior exemplo disso foi na floricultura, uma vez que não é permitida a realização de eventos e festas de casamento, a demanda por flores caiu bruscamente.
Outro setor que sofre esses impactos, mesmo que de maneira mais branda, é o sucroenergético, pela menor circulação de pessoas, ainda combinado a diminuição dos preços do biocombustível no país, cenário esse que propicia as usinas a voltarem a sua produção para o açúcar, pelo menos até a retomada da economia.
Os impactos na taxa de câmbio, com o dólar atingindo o seu maior valor nominal em toda série histórica no início de abril, beneficiando, a curto prazo, os exportadores do agronegócio brasileiro.
Tendências de mudança
É possível que seja revista a forma como operam os sistemas vigentes de vigilância e controle sanitário em todo o mundo, ou chamado Food Trust, de forma a reduzir o surgimento de futuras pandemias como a do coronavírus. Assim, o Brasil deverá investir cada vez mais em mecanismos de controle, públicos ou privados, com o intuito de garantir a segurança dos alimentos produzidos para os mercados doméstico e internacional.
Seguindo a mesma linha, tomando os elementos da cadeia de suprimentos como exemplo, o uso de novos EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) pelos colaboradores, e equipamentos da linha de produção e transporte precisaram ser desinfectados de maneira mais cuidadosa e com maior frequência, atualmente.
Analisando pelo viés populacional, as mudanças de hábito de consumo dos alimentos vem ocorrendo nos últimos anos em decorrência das constantes transformações vividas nesse período, no entanto, a atual crise acelerou esse processo. Como os consumidores deixaram de frequentar restaurantes, passaram a comprar mais alimentos em supermercados e a prepararem suas refeições em casa, seja pela restrição econômica ou por medo de contaminação do vírus.
Evidência disso está no estudo do Blacktower Financial Management Group, o consumo nos mercados na Inglaterra, durante a crise, aumentou em £ 361 milhões por semana, ou cerca de £ 13 libras por residência por semana, um crescimento de 21% em relação ao consumo médio no país. No Brasil, segundo a Associação Paulista dos Supermercados (APAS), as compras online deste segmento cresceram 107% na última semana de março em São Paulo (SP).
Cenário esse preocupante para os segmentos do agronegócio que possuem os restaurantes e food services como principais clientes e receita. A cadeia produtiva de hortifruticolas, por exemplo, poucos fornecedores conseguem acessar grandes redes varejistas, logo, os produtores menores destinavam sua colheita para restaurantes e centrais de abastecimento, assim, pode haver a necessidade das empresas desenvolverem novos canais de distribuição para seus produtos ou encontrarem maneiras alternativas para leva-los diretamente aos clientes finais.
Com isso, o desenvolvimento de novas tecnologias pode ganhar espaço para suprir serviços em tempo de isolamento, como tecnologias digitais que conectem caminhoneiros a cargas disponíveis para transporte, ou o uso mais intensivo de plataformas de comércio online para conseguir vender os produtos.
Retomada econômica e o agronegócio
Até o momento, o agronegócio vem superando os desafios impostos pelo Covid-19 sobre o abastecimento de alimentos. Enquanto alguns importantes países exportadores de alimentos restringiam embarques para garantir a oferta interna destes produtos e outros sofreram com a falta de mão de obra para produzi-los, o Brasil teve destaque e se posicionou como um fornecedor de alimentos confiável.
Imunes aos efeitos da pandemia de Covid-19 na economia, as exportações do agronegócio brasileiro bateram novo recorde no período de janeiro a maio de 2020, com um total de US$ 42 bilhões. O total exportado no mês passado, de US$ 10,9 bilhões, também foi o maior da história do agronegócio, com uma alta de 17,9% em comparação a maio de 2019, o que garantiu um superávit de US$ 10,1 bilhões no período. Em volume, as vendas foram de 28,8 milhões, com um crescimento de 34,1%.
Segundo a Confederação de Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), em valores, as exportações do agronegócio realizadas de janeiro a maio aumentaram 7,9% em relação ao mesmo período de 2019. A China foi o principal importador do Brasil, sendo destino de 39,3% dos embarques dos produtos do agro.
Mesmo com esse resultado, as empresas devem se reinventar para garantir um crescimento sustentável e manter bons resultados pós-Covid. Elas precisaram se mobilizar para garantir a segurança dos colaboradores e estabelecer uma resposta estruturada, buscando estabilização com respostas táticas aos desafios apresentados pelo novo cenário, e possuir um bom planejamento estratégico para seguir mais forte.
Para todas as adaptações necessárias e mudanças propostas, ou até mesmo para financiamento da própria operação, as empresas necessitaram de capital, as companhias do setor do agronegócio são capazes de contar com a emissão de títulos de dívida específicos para elas, como os Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), destinado a sua cadeia completa, e as CPRs (Cédulas de Produto Rural).
Diante do cenário favorável e a necessidade de investimentos diversas empresas desse setor já buscam o mercado de capitais como alternativa para essa captação de recursos. Como o grupo Ecoagro que anunciou no dia 3 de Abril, a emissão Certificados de Recebíveis do Agronegócio (CRA), através de oferta pública IN 476, no montante de R$ 18 milhões. A operação de CRA foi estruturada com lastro de CDCA emitido pelo Grupo Araunah, indústria da cadeia de Insumos localizada em Uberaba-MG. A captação tem como objetivo financiar as vendas da Araunah junto a produtores rurais para a aquisição de Insumos agrícolas da próxima safra.
Tainah Benevides
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